Não
ando lá com muita concentração para ler, mas nesse instante, (quem
me conhece sabe ao que me refiro), minha salvação é tentar afundar-me na
leitura, e quiçá, arriscar-me em uma analise de texto. Não foi um texto
tão extenso não, contudo demorei nele vinte dias, por falta
de
concentração. Voltei às primeiras páginas umas duas vezes, li e reli, por
ter
os pés e a alma no nordeste, a linguagem me chamou atenção, tentei compreender
os termos usados, como os ouvia. Palavras das quais, não ouço a muito
tempo, enfim, arremeteram-me à infância. Em certa ocasião elas
soavam-me tão estranhas aos ouvidos, quando já adolescente, aqui em São Paulo, que por diversas vezes pensei que
nem existiam no dicionário, (tolice minha,é claro),e que até tivessem sido
criadas pela "ignorância" dos nordestinos.
Agora
posso ver claramente que não existe povo tão sábio quanto o sertanejo, e
tudo conseguido às duras penas, sem os recursos do povo do Sul... Hoje é
sabido que há na língua portuguesa uma riqueza enorme, e que nenhuma
palavra é criada ao acaso, sendo que algumas são atemporais, outras caem
de moda, deste modo, não cabe mais nos nossos dias o preconceito
linguístico. Achar que uma palavra é certa ou errada é ignorância. O que
temos é uma riqueza de linguagem extensa, que devido ao regionalismo, a
cultura, e ao meio social, são mais usadas ou não.
A
secura daquelas terras invadiu a alma de muitos homens. A fome matada à
calango, a sede à água de cacimba e um olhar perdido no horizonte a
espera de milagres. E ainda assim, não há povo que tenha mais fé, acho
que
a única coisa que lhes resta mesmo é a reza, e tudo resume-se a isso,
festas religiosas e novenas. Olhar para o horizonte e pedir a
Deus que mande água, comida ou a morte como salvação, essa é a reza principal
do sertanejo. Como o pensamento é
o que de mais oculto temos, então pedem perdão dos pecados a todo
instante... No fundo devem maldizer a Deus e a todos os Santos por
tamanha miséria, por terra tão desgraçada.
Vamos ao romance:
É de uma narrativa tão rica, que em alguns momentos, para mim,Paulo Honório e Graciliano são a mesma pessoa, ( rs, criador e criatura).
O que é descrito no texto é uma grande solidão e uma vida inteira de
erros. Erros estes que não podem mais ser corrigidos, mas bem que
poderiam render um outro romance se ele enxergasse em si próprio a
mudança. O que não era possível, pois a expectativa de vida no nordeste
naquela época não chegava aos 40 anos, e por este motivo, Paulo Honório
considerava-se um velho aos 50 anos de idade, nisso não via a
possibilidade de ser amado por sua esposa, por achar-se velho e
inferior. Também devido a instrução de Madalena, mulher das letras e
participativa da vida social, política e econômica, pelo menos em informação, cuja literatura fazia com que ele pensasse, que ela seria comunista.
Ainda
que houvesse o desprezo por todos que o cercavam, era neles que o seu
ciúme via qualidades. Seu orgulho doentio não poderia admitir isso,daí
passa a torturar os empregados, "amigos" e a esposa até levá-la ao
suicídio... E para espantar a solidão, nada mais restava a ele,a não ser,
escrever seus mandos e desmandos: suas memórias. Sem conhecer os
pais, Paulo Honório fora criado pela negra doceira Margarida, e com a
venda de suas cocadas ganhavam o sustento. Também foi guia de cegos e
como todo sertanejo finca pé na roça. Ao passar para a maior idade,
cometeu um crime, (de peixeira), é claro que, e em "nome da honra", por
um rabo de saia que fora sua primeira mulher.
Na cadeia
aprendeu a ler, e ao sair arranja dinheiro emprestado e passa a ser
mascate, até chegar ao negócio de bois, onde sua cabeça ao lidar com
valor maior volta-se somente a amealhar dinheiro. Que com rara "esperteza"
passa a perna em quem estiver por perto. Finge-se de amigo, e
consegue as terras de São Bernardo por uma quinquilharia, aproveitando-se da fraqueza e ingenuidade de Luis Padilha. Se teve um
dia alguma noção de certo ou errado, perdeu-a completamente com a
ganância. Engana, invade terras, avança cercas, manda matar de tocalha, um homem sem
escrúpulos, não poupa esforços para realizar seus propósitos.
História
de muitos fazendeiros dos sertões do nordeste, (inclusive do meu avô).
Entretanto, em dado momento desperta um certo heroísmo aos meus olhos
de leitora, e chego a torcer por ele. Sem muita instrução e cultura, mas
dono de uma inteligência e esperteza fenomenal, diferente de
sua esposa, infiltra-se na política, chegando a receber até o
governador em sua fazenda. Por aquelas bandas a maior riqueza eram terras, e quem as possuía
era doutor ou coronel...(como nos dias de hoje). Ser amigo do juiz, do
padre e do
delegado outorgava direito a "carta branca" ,e diante isso, acima da lei, que dirá ser amigo do governador?...
Lutou
tanto por riqueza que matou seu lado sentimental, o desejo sexual inerente ao
ser humano saciava com a mulher de seu empregado, mandando-o para
afazeres longe da fazenda, enquanto deleitava-se com Rosa. Seu tempo era dedicado somente ao trabalho, esquecera-se do amor. Apenas pensou em
casar-se para ter um herdeiro, o qual nunca lhe despertou , sequer, um
tiquinho de amor. Nos capítulos que segue-se ao casamento esperei um
pouco de romance, mas qual?... Logo estava ela parindo e ao invés de
despertar o amor e o desejo daquele homem, despertou aos seus olhos a displicência que teve consigo mesmo, de envelhecimento e de sua inferioridade, por
conseguinte, seu
ciúme doentio.
Paulo Honório não via igualdade entre os seus
semelhantes, ainda que vindo da mesma origem que a sua. Para ele quem
não alcançava riqueza não tinha inteligência suficiente, e logo, não
era merecedor de seu respeito, tampouco sua compaixão. A escravidão já havia acabado,
todavia, por
aqueles lados parecia que não, pois se seus empregados não andassem na
linha, chegavam a ser esbofeteados, humilhados e espancados sem defesa,
na frente de qualquer um... Sem contar que, a miséria não o comovia de modo
algum, tanto que , sua esposa ao tentar aliviar um pouco da fome, da
desigualdade e injustiça pelos baixos salários pagos por ele, amealhou
foi ainda mais a sua raiva, que para ele, ela não sabia o sacrifício que
havia feito para ganhar a sua fortuna...o que ela sabia é que ele foi capaz de matar, e isso incomodou-o de
sobremaneira.
Causando-lhe ainda mais sanha, junto ao ciúme que por ela alimentou, até levá-la à morte e a sua completa solidão.
[Talvez, tenha passado fatos desapercebidos por mim,porém descrevi o que me marcou no romance, espero que alguém leia...rs,rs.]
[A música está na alma de nossa gente, Luiz Gonzaga é nosso representante Maior]
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